quinta-feira, 14 de outubro de 2010

Lendas e Mitos

   As Lendas são as formas mais simples de manter e ensinar os mistérios da Arte. Através de pequenos contos ou formas simbólicas de representar um acontecimento os povos vêm durante as eras ensinando sua cultura, suas religiosidades, e criando uma forma bonita e fácil de manter vivo o conhecimento na mente das pessoas, até daquelas que não dispõem de um bom nível educacional.
   Na WICCA as lendas são uma forma direta de passar ensinamentos, ou de embelezar suas crenças, às vezes criamos lendas para coisas que possuem uma explicação direta e simples, mas como a lenda nos obriga a refletir e indagar, os sacerdotes possuem uma preferência por ensinar os neófitos através de lendas. Logo, quando ler algum conto WICCANO dedique tempo para uma boa reflexão e tente encontrar ali ensinamentos, pois com certeza todas as lendas possuem informações importantíssimas.

Algumas Lendas 





A caixa de Pandora

Epimeteu era  irmão de Prometeu, o  titã que modelou o primeiro homem do barro. No entanto, este, por desavenças com Júpiter, acabara por incorrer na sua ira.
          Temendo  que  Júpiter  viesse  a  querer  se  vingar  dele  ou  do  gênero  humano,  Prometeu decidiu um dia alertar o seu desavisado irmão:
          — Epimeteu, tome cuidado com os presentes que receber de Júpiter — disse Prometeu, chamando-o para um canto. —  Já há algum  tempo que ele anda  furioso comigo, porque ousei roubar o Fogo dos céus para levá-lo aos homens.
          Epimeteu escutou com atenção as palavras judiciosas do irmão e logo as esqueceu com o mesmo empenho.
          Enquanto isso, no Olimpo, Júpiter já havia ordenado a Vulcano — que tinha também as suas veleidades de artífice — que criasse uma nova criatura, uma parelha para o homem.
          — Deixa comigo — disse o deus das forjas.
          Fechando-se em sua fuliginosa oficina com a deusa Minerva, os dois entregaram-se com extraordinário denodo à interessante tarefa. Decorrido algum tempo, a obra estava pronta.
          — Nunca nada de mais perfeito saiu de suas talentosas mãos, excelente Vulcano! — disse Minerva, entusiasmada.
          — Graças a você, cara amiga, que me auxiliou com seus proveitosos conselhos! — disse Vulcano, devolvendo o elogio.
          Diante dos dois  estava um  linda mulher, quase  tão bela quanto a mais bela das deusas. Seus olhos era azuis como o mais límpido céu e de sua boca vermelha e úmida partia um hálito fresco  e  perfumado.  Sua  pele  era macia  como  o mais macio  dos  veludos  e  recobrindo-a  por inteiro havia ainda uma delicada penugem, que lembrava em tudo a maciez da casca do pêssego. Seus  membros,  por  sua  vez,  eram  delicadamente  proporcionados,  tendo  sido  exilada  deles  à força,  em proveito da  graça. A  frente do peito da  encantadora  criatura, Minerva  coloca-n dois pomos que tinham o prodígio de serem, ao toque, ao mesmo tempo macios e firmes, coroando-os  ainda,  num  requinte  de  perfeição,  com  duas  delicadas  protuberâncias,  que  lembravam  duas pequenas cerejas.
          Suas curvas eram perfeitas. De cada flanco do corpo desciam duas linhas curvas voltadas para  dentro,  expandindo-se  somente  à  altura  da  cintura  para  dar  lugar  a  um  estonteante panorama, tendo ao centro um triângulo hermético, que guardava dentro de si todos os segredos da vida e de sua procriação.
          — Vamos, levemos já nossa invenção a Júpiter, para que ele nos dê logo a sua aprovação! — disse Minerva, tão confiante que já dava por certa a aprovação de seu exigente pai.
          E não foi de outra maneira. Tão logo o deus dos Deuses pôs os seus olhos sobre a nova criatura, eles encheram-se de um brilho intenso.
          — Vulcano  e Minerva, vocês  excederam-se  em  tudo o que  se  refere  à beleza! — disse Júpiter, aplaudindo com entusiasmo a obra que tinha diante de si.
          — Batizamos ela de Pandora, meu pai — disse Minerva. — O que acha deste nome?
          —  Pandora,  Pandora  —  repetiu  Júpiter,  deliciado.  —  Tem  um  som  volátil,  alado... Magnífico!
          Antes, porém, de dispensar a criatura, chamou-a a um canto.
          —  Venha  cá,  Pandora,  tenho  um  presente  para  você.  Quero  que  você  leve  isto  aos mortais como sinal de meu apreço por eles — disse Júpiter, entregando-lhe uma caixa dourada, ricamente trabalhada com arabescos e filigranas de prata.
          Pandora arregalou os olhos ao ver diante de si aquele presente tão magnífico. Sem poder conter-se, quis logo abrir a maravilhosa caixa, mas foi impedida pelo autor do presente.





A Deusa no Reino da Morte 

Neste mundo, a deusa é vista na lua, aquela que brilha na escuridão, aquela que traz a chuva que move as marés, a senhora dos mistérios.
E, enquanto a lua cresce e mingua, e anda três noites no sei ciclo da escuridão, diz-se que a deusa, certa vez passou três noite no reino da morte.
Pois, no amor, ela sempre busca seu outro self e, uma vez no inverno do ano em que ele havia desaparecido da terra verde, ela o seguiu e chegou, finalmente, aos portões além dos quais os vivos não entram.
O guardião do portão desafiou-a e desnudou-se de suas roupas e jóias, pois nada pode ser levado para aquela terra.
Por amor ela estava aqui confinada como todos os que ali penetram, e foi conduzida à morte.
Ele a amava e ajoelhou-se a seus pés, deu-lhe o beijo quíntuplo e disse: -Não retorne ao mundo dos vivos, mas permaneça aqui comigo e tenha paz, descanso e conforto. Mas ela respondeu: -Por que você faz com que todas as coisas que amo e prezo murchem e morram? -Senhora - disse ele -É destino de tudo que aquilo que vive morrer. Tudo passa, tudo se esvai. Eu trago conforto e consolo para aqueles que cruzam os portões, para que possam rejuvenescer, mas você é o desejo do meu coração, não volte, fique aqui comigo.
E ela ficou com ele durante três dias e três noites, e ao final da terceira noite, ela colocou sua coroa, que se tornou o diadema que ela colocou em seu pescoço, dizendo: -Eis o circulo do renascimento. Através de você todos saem da vida, mas através de mim todos podem renascer novamente. Tudo passa tudo muda. Mesmo a morte não é eterna. Meu é o mistério do ventre, que é o caldeirão do renascimento. Penetre em mim e me conheça e estará liberto de todo o medo. Pois se a vida é somente uma passagem para a morte, a morte é somente uma passagem de volta para a vida e em mim, o círculo sempre gira.
Amorável ele penetrou-a e assim renasceu para a vida.
No entanto ele, é conhecido como senhor das sombras, o confortador e consolador, aquele que abre os portões, rei da terra da juventude, o que dá paz e descanso.
Mas ela é a mãe de toda a vida; dela todas as coisas nascem e para ela devem retornar novamente.
Nela estão todos os mistérios da morte e do renascimento; nela encontra-se a realização de todo o amor.
 
 
 

 

A Lenda da Descida da Deusa ao Mundo Subterrâneo

Nos tempos antigos, nosso Senhor, o Cornudo, era (e ainda é) o Consolador, o Confortador.
Mas os homens o conheciam como o terrível Senhor das Sombras, solitário, inflexível e justo.
Mas nossa Senhora, a Deusa resolveria todos os mistérios, até mesmo o mistério da morte; e assim ela viajou ao Mundo Subterrâneo.
O Guardião dos Portais a desafiou...

"...Tira tuas vestes, põe de lado tuas jóias, pois nada tu podes trazer contigo o interior desta nossa terra ."

Assim ela se despojou de suas vestes e de suas jóias, e foi amarrada, como todos os vivos que buscam ingressar nos domínios da Morte, a Poderosa, têm que ser.
Tal era a beleza dela, que a própria Morte se ajoelhou e depositou sua espada e coroa aos seus pés...

... E beijou seus pés, dizendo: "Abençoados sejam teus pés, que te trouxeram por estes caminhos. Permanece comigo, mas deixa que eu ponha minhas mãos frias sobre o teu coração."

E ela respondeu: "Eu não te amo. Por que fazes todas as coisas que amo e nas quais me comprazo fenecerem e morrerem?"

"Senhora" – respondeu a Morte – "Trata-se da idade e da fatalidade, contra as quais sou impotente. A idade, o envelhecimento, leva todas as coisas a definharem; mas, quando os homens morrem ao desfecho de seu tempo, concedo-lhes repouso, paz e força para que possam retornar. Mas tu, tua és linda. Não retornes, permanece comigo."

Mas ela respondeu: "Eu não te amo".

E então disse a Morte: "Se não recebem minhas mãos sobre seu coração, tens que te curvar ao açoite da Morte."

"É a fatalidade, melhor assim..."
– ela disse e se ajoelhou.

E a Morte a açoitou brandamente.

E ela bradou: "Eu conheço as aflições do amor."

E a Morte se ergueu e disse: "Sejas abençoada."

E lhe deu o beijo quíntuplo, dizendo: "Assim apenas pode atingir a alegria e o conhecimento".

Então a Morte desamarra os seus pulsos, depositando o cordel no chão.
E ele a ela ensina todos os seus mistérios e lhe dá o colar que é o círculo do renascimento.
A Deusa, então, toma a coroa e a recoloca na cabeça do Senhor do Mundo Subterrâneo.
E ela ensina a ele o mistério da taça sagrada, que é o caldeirão do renascimento.
A Deusa toma o cálice em ambas as mãos, eles se entreolham, e ele coloca ambas as mãos nas dela.
Eles amaram e se tornaram um, pois há três grandes mistérios na vida do homem, e a magia os controla todos.
Para realizar o amor, tendes que retornar novamente no mesmo tempo e no mesmo lugar daqueles que são os amados; e tendes que encontrá-los, conhecê-los, lembrá-los e amarrá-los de novo.
O Senhor do Mundo Subterrâneo solta as mãos da Deusa e esta recoloca o cálice no seu lugar.
Ele toma o açoite em sua mão esquerda e a espada na sua mão direita e fica na posição do Deus, antebraços cruzados sobre o peito, espada e açoite apontados para cima.
Ela fica na posição da Deusa, pernas escarranchadas e braços estendidos formando o pentagrama.
Mas para renascer tendes que morrer e ser preparado para um novo corpo.
E para morrer tendes que nascer, e sem amor não podes nascer.
E nossa Deusa sempre se inclina para o amor, e o júbilo, e a ventura; e ela protege e acaricia suas crianças ocultas na vida, e na morte ministra o caminho da comunhão com ela; e mesmo neste mundo ela lhes ensina o mistério do Círculo Mágico, que é disposto entre os mundos dos homens e dos Deuses

 

 

O Nascimento de Vênus

   A véspera do nascimento de Vênus fora um dia violento. O firmamento, tingindo-se subitamente de um vermelho vítreo, enchera de espanto toda a Criação. Saturno, munido de sua foice, enfrentara o próprio pai, o Céu, num embate cruel pelo poder do Universo. Com um golpe certeiro, o jovem deus arrancara fora a genitália do pai, tornando-se o novo soberano do mundo. Um urro colossal varrera os céus, como o estrondo tremendo de um infinito trovão, quando o Céu fora atingido.           O fecundo órgão do deus deposto, caindo do alto, mergulhara nas águas profundas, próximo à ilha de Chipre. Assim, o Céu, depois de haver fecundado incessantemente a terra — dando origem à estirpe dos Deuses olímpicos -, fecundava agora, ainda que de maneira excêntrica e inesperada, o próprio Mar.
          Durante toda a noite o mar revolveu-se violentamente. A espuma do mar, unida ao sangue do deus caído, subia ao alto em grandes ondas, como se lançasse ao vento os seus leves e espumosos véus. Mas quando a Noite recolheu finalmente o seu grande manto estrelado, dando lugar à Aurora, que já tingia o firmamento com seus dedos cor-de-rosa, percebeu-se que as águas daquele mar pareciam agora outras, completamente diferentes.
          O borbulhar imenso das ondas anunciava que algo estava prestes a surgir.
          Das margens da ilha de Chipre, algumas ninfas, reunidas, apontavam, temerosas, para um trecho agitado do mar:
          — O mar está prestes a parir algo! — disse uma delas.
          — Será algum monstro pavoroso? — disse outra, temerosa.
         Mas nem bem o sol lançara sobre a pátina azulada do mar os seus primeiros raios, viu-se a espuma, que parecia subir das profundezas, cessar de borbulhar. Um grande silêncio pairou sobre tudo.
          — Sintam este perfume delicioso! — disse uma das ninfas.
          As outras, erguendo-se nas pontas dos pés, aspiraram a brisa fresca e olorosa que vinha do alto-mar. Nunca as flores daquela ilha haviam produzido um aroma tão penetrante e, ao mesmo tempo, tão discreto; tão doce e, ao mesmo tempo, tão provocantemente acre; tão natural e, ao mesmo tempo, tão sofisticado.
          De repente, do espelho sereno das águas — nunca, até então, o mar tivera aquela lisura perfeita de um grande lago adormecido — começou a elevar-se o corpo de alguém.
          — Vejam, é a cabeça de uma mulher! — gritou uma das ninfas.
          Sim, era uma bela cabeça — a mais bela cabeça feminina que a natureza pudera criar desde que o mundo abandonara a noite trevosa do Caos. Um rosto perfeito: os traços eram arredondados onde a beleza exigia que se arredondassem, aquilinos onde a audácia pedia que se afilassem e simétricos onde a harmonia exigia que se emparelhassem.
          O restante do corpo foi surgindo aos poucos: os ombros lisos e simétricos, os seios perfeitos e idênticos — tão iguais que nem o mais consumado artista saberia dizer qual era o modelo e qual a sua réplica perfeita. Sua cintura, com duas curvas perfeitas e fechadas, parecia talhada para realçar o umbigo perfeito, o qual acomodava delicadamente, como um encantador pingente , uma minúscula e faiscante pérola. E, logo abaixo, um véu triangular — loiro e aveludado véu -, tecido com os mais delicados e dourados fios, agitava-se delicadamente, esbatido pela brisa da manhã. Nenhum humano podia saber ainda o que ele ocultava — seu segredo mais cobiçado, que somente a poucos seria revelado.
          Algumas aves marinhas surgiram, arrastando uma grande concha, a qual depositaram ao lado da deusa — sim, era uma deusa -, para que ela, como em um trono, se assentasse. Um marulhar de peixes saltitantes a cercava, enquanto golfinhos puxavam seu elegante carro aquático até as areias da praia cipriota.
          Nem bem a deusa colocara os pés na ilha, e toda ela verdejou e coloriu-se como nunca antes havia sido. Por onde ela passava, brotavam do próprio solo maços aromáticos de flores multicores, os pássaros todos entoavam um concerto de vozes perfeitamente harmoniosas e os animais quedavam-se sobre a relva com as cabeças pendidas, para receber o afago daquela mão alva e sedosa.
          — Quem é você, mulher mais que perfeita? — perguntou-lhe, finalmente, a ninfa que primeiro recuperara o dom da fala.
          — Sou aquela nascida da espuma do mar e do sêmen divino — respondeu a deusa, com uma voz cristalina e docemente áspera, envolta num hálito que superava em delícia ao de todas as flores que seus pés haviam feito brotar.
          No mesmo dia, a extraordinária notícia do nascimento de criatura tão bela chegou ao Olimpo, e os Deuses ordenaram que as Horas e as Graças a fossem recepcionar. Ainda mais enfeitada pelas mãos destas caprichosas divindades, apresentou-se a nova deusa diante de seus pares no grandioso salão do Olimpo, sendo imediatamente acolhida e festejada pelos deuses.
         
          Mas quando todos ainda se perguntavam quem seria, afinal, aquela criatura encantadora, um descuido — seria, mesmo? — pôs fim a todas as indagações. Pois o véu que a envolvia, descendo-lhe até os pés, revelara o que nenhum dos embelezamentos artificiais pudera antes realçar: a sua infinita beleza original.
          — E Vênus, sim, a mais bela das deusas! — disse o coro unânime das vozes.


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